Apostas no Conclave: uma questão moral e teológica sobre a objetificação da liderança religiosa

Apostas no Conclave: uma questão moral e teológica sobre a objetificação da liderança religiosa
Game of Chess (1494-1533) Lucas van Leyden

Com o início do Conclave nesta quarta-feira, 7 de maio, cresce a expectativa em torno da escolha do novo Papa. Porém, junto com a atenção legítima dos fiéis, um movimento paralelo tem ganhado força e provocado desconforto: o mercado internacional de apostas, que movimenta milhões de dólares tentando prever quem será o próximo sucessor de Pedro.

Segundo o site Polymarket, mais de US$ 18 milhões — aproximadamente R$ 100 milhões — já foram apostados na eleição papal. Embora esse tipo de prática seja proibido no Brasil pela Lei nº 14.790/2023, o fato de o Vaticano estar no centro de uma aposta global suscita importantes reflexões éticas e morais, especialmente à luz da teologia e do respeito à figura do Papa como líder espiritual.

Na tradição católica, a escolha de um novo pontífice não é apenas um processo institucional, mas um ato profundamente espiritual. É um momento de escuta e discernimento comunitário, guiado pela oração e pela invocação do Espírito Santo. Transformar essa escolha em objeto de especulação mercadológica — com probabilidades, cotações e lucros financeiros — fere não apenas a sacralidade do processo, mas também a dignidade do cargo e de quem o ocupa.

Do ponto de vista teológico, isso levanta a grave questão da objetificação do sagrado. Ao reduzir o Papa a um “nome” numa planilha de apostas, esvazia-se seu papel como sucessor de Pedro, pastor universal e símbolo de unidade para mais de um bilhão de fiéis. Trata-se de um esvaziamento do mistério em favor do espetáculo, um deslocamento do sagrado para a lógica do consumo e do entretenimento.

Além disso, esse tipo de prática colide com princípios éticos fundamentais do cristianismo: o respeito pela pessoa humana, a seriedade dos processos de discernimento e o repúdio à mercantilização de dimensões espirituais. A teologia moral também aponta para o risco de escândalo: os fiéis podem se sentir desorientados ou até mesmo ofendidos ao ver que, enquanto muitos rezam e acompanham o Conclave em comunhão e fé, outros lucram com palpites sobre um processo tão delicado.

Esse cenário desafia também os espaços formativos, como os cursos de Teologia — como o do Instituto São Paulo de Estudos Superiores (ITESP) — que têm a missão de formar líderes sensíveis aos sinais dos tempos. Professores e estudantes são convocados a refletir criticamente sobre a banalização do religioso e sobre os limites éticos do entretenimento em relação à fé. É também uma oportunidade de educar para o discernimento: entender o que significa escolher um líder espiritual e como isso repercute socialmente em políticas de paz, justiça e solidariedade no mundo todo.

Mais do que julgar as práticas de fora, é hora de cultivar a consciência dentro: um Papa não é uma aposta. Ele é um sinal de esperança, de continuidade da missão de Cristo e de comunhão da Igreja. Tratar sua eleição como um jogo de azar fere não só a fé, mas também a humanidade. Afinal, um líder religioso, especialmente na figura do Papa, representa muito mais que um nome com chances: ele é, para muitos, a voz do Evangelho no presente da história.

Por: Arison Lopes, Comunicação ITESP

Imagem: Game of Chess (1494-1533) Lucas van Leyden

Fonte1: CNN Brasil

Fonte 2: InfoMoney