Explorando as fronteiras da mente com a Prof.a Eliana Massih: Reflexões sobre Chips Cerebrais

Explorando as fronteiras da mente com a Prof.a Eliana Massih: Reflexões sobre Chips Cerebrais

Foto: Divulgação/Three Square Market)

O Instituto São Paulo de Estudos Superiores (ITESP) dá início a uma série de matérias especiais que abordarão questões morais, éticas, psicológicas e sociais relacionadas ao uso de chips cerebrais em humanos. Para inaugurar essa série, entrevistamos a Prof.a Dra. Eliana Massih, psicóloga clínica e doutora em ciência da religião, que compartilhou suas reflexões sobre os potenciais impactos dessas tecnologias na sociedade.

A Neuralink, empresa liderada por Elon Musk, recentemente realizou o primeiro implante de chip cerebral em um ser humano, marcando um avanço significativo no campo da interface cérebro-computador. Para compreender melhor os possíveis desdobramentos desse avanço, conversamos com a Prof.a Eliana Massih, que ofereceu pontos valiosos sob uma perspectiva psicológica e ética.

Em relação aos impactos na saúde mental individual e coletiva, a Prof.a Eliana destacou a importância da consciência ética ligada ao uso dessas tecnologias. Ela ressaltou a necessidade de reflexões sobre os limites éticos da ciência e o cuidado com possíveis abusos em nome do progresso tecnológico.

Sobre os aspectos éticos e morais, a professora do ITESP enfatizou a necessidade de promover a autonomia e a identidade individuais, especialmente diante da implementação generalizada de interfaces cérebro-computador. Ela destacou a importância de facilitar a compreensão das questões éticas envolvidas e promover a formação de indivíduos capazes de fazer escolhas informadas e conscientes.

Quanto à privacidade mental e à possível manipulação de pensamentos, a Prof.a Eliana alertou para os desafios de lidar com essas questões em um contexto de crescente dependência de tecnologias neurológicas avançadas. Ela ressaltou a importância de permanecer em alerta e fornecer suporte, formação e informação sobre os avanços das neurociências. Acompanhe a entrevista completa com a professora:

ITESP: Sob a perspectiva psicológica, como enxerga os possíveis impactos na saúde mental individual e coletiva decorrentes da integração de tecnologias como o implante de chip cerebral proposto pela Neuralink?

Eliana Massih: Ainda não sabemos dos impactos que esta tecnologia trará. Sabemos sim que os avanços da Inteligência Artificial atingem todas as camadas da população global. Ricos e pobres; cultos e incultos, crianças, jovens, adultos jovens e idosos são usuários de seus benefícios e dissabores. O que nos falta ainda é a consciência ética ligada ao uso.

Em entrevista ao Fantástico no dia, 04 de fevereiro, o renomado cientista brasileiro Miguel Nicollelis afirmou ter sido professor e orientador de 3 dos engenheiros envolvidos neste projeto. Afirmou ainda que eles nunca mencionaram que pretendiam abrir uma empresa e implantar chips em humanos. A Ciência deve avançar sim. Porém deve ser iluminada por reflexões éticas e morais.

ITESP: Considerando os aspectos éticos e morais, qual seria a influência psicológica de longo prazo na sociedade, especialmente em termos de identidade e autonomia, diante da implementação generalizada de interfaces cérebro-computador?

Eliana Massih: Em primeiro lugar: Para que uma pessoa seja considerada autônoma é preciso:

  1. Que ela compreenda e análise uma situação racionalmente (racionalização).
  2. Que ela tenha habilidade para escolher entre várias hipóteses (deliberação)
  3. Que ela tenha liberdade para fazer sua escolha livre de qualquer influência (voluntariedade)

Cabe a nós psicólogos e – igualmente – ao padre, aos consagrados em geral, as agentes pastorais promover a busca da ativação destas competências. Para isto devemos facilitar a compreensão das categorias apresentadas acima, o que toma tempo, disposição e demanda um projeto pedagógico. Estamos preparados para fornecer este suporte? Ainda não. Porém temos condições de nos prepararmos para isto. A sociedade civil e os fiéis esperam isto de nós. Quanto ao quesito identidade. Quem somos nós hoje em dia? Podemos falar de identidades sólidas num momento histórico de revisão de modelos de Eu, de aceitação de múltiplas identidades?

ITESP: Do ponto de vista psicológico e tecnológico, como a sociedade pode lidar com as questões relacionadas à privacidade mental e à possível manipulação de pensamentos que podem surgir com o avanço dessas tecnologias?

Eliana Massih: Esta é nossa grande questão. Um filósofo ateu contemporâneo Luis Felipe Pondé tem falado de perfectibilidade. O conceito resume a ideia de que nós humanos temos o necessário e o suficiente para nos tornarmos cada vez melhores. Pondé, um pessimista por excelência acha o contrário: a imperfectibilidade do humano é recorrente na história. Nós melhoramos e pioramos ao longo de nossa evolução.

Pessoas de fé que somos acreditaremos na perfectibilidade. Pessoas racionais que somos contaremos com a verdade do conceito oposto: a imperfectibilidade sempre nos assombrará. Nada sabemos ainda sobre os efeitos deste avanço.  Assim, toda cautela é bem-vinda. Nós humanos temos virtudes e limites. O perigo habita nos limites. Abusos poderão ocorrer em nome de instâncias de poder, em nome de justificativas de momento histórico, em nome de nossa economia predatória etc.

Tenho assistido uma série recém-lançada pela Amazon Prime. O nome da série é The Feed e merece ser vista por todos nós que abordamos o humano no modo da educação, da evangelização e principalmente da formação ética e moral. A série aborda exatamente atos e consequências de uma empresa familiar especializada em implante de chips no cérebro humano.

ITESP: Em termos psicológicos, como a sociedade pode gerenciar os potenciais impactos psicossociais da crescente dependência de tecnologias neurológicas avançadas, considerando aspectos como inclusão, exclusão e possíveis disparidades sociais?

Eliana Massih: As disparidades socioeconômicas são gritantes em nosso mundo globalizado. O que poderia ser alvo de aplauso, como o uso médico do implante de chips em pessoas com problemas e doenças neurológicas severas, passa a ser alvo de críticas e cautela quando imaginarmos o uso que se fará de tecnologias de alto preço privilegiando uma casta que poderá pagar altos valores para “passar na frente” da população carente de recursos.

Inclusão seria um dos efeitos mais desejados da nova tecnologia. Teríamos que contar com a perfectibilidade do amadurecimento dos humanos que operariam sempre para o bem maior: uma sociedade justa, gentil e acolhedora daqueles que nasceram desprotegidos e vulneráveis do ponto de vista econômico e geopolítico. Assusta-me a ideia de que os desvalidos possam servir de cobaias humanas.

Nosso dever de cristãos é permanecer em alerta e fornecer suporte, formação e informação sobre os avanços das Neurociências. A este respeito indico o derradeiro livro de Edenio Valle (O espectro temático da psicologia científica da religião à luz das neurociências. Ed Paulinas. São Paulo. SP. 2020). No âmbito de nosso trabalho na formação de padres, religiosos e agentes pastorais devemos prever projetos de educação para o uso ético das novas tecnologias.

A série especial do ITESP continuará explorando essas questões complexas e multifacetadas, trazendo contribuições de professores, alunos e ex-alunos do Instituto. Este é um convite para uma reflexão aprofundada sobre o impacto dessas tecnologias em nossa sociedade e o papel da ética e da moralidade em sua aplicação.

Na próxima edição, continuaremos nossa série de reflexões sobre o uso de chips cerebrais com uma entrevista exclusiva com o ex-professor do ITESP, Pe. Rogério Gomes, superior geral dos missionários redentoristas, teólogo e bioético. Não perca essa oportunidade de aprofundar ainda mais o debate sobre os desafios morais, éticos e sociais relacionados a essa tecnologia emergente.

Por: Arison Lopes, Comunicação Institucional ITESP

Imagem: Divulgação | Three Square Market.

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